MARTA

MARTA
O ADEUS PRECOCE DA MINHA ESTRELA MAIOR

domingo, 13 de dezembro de 2015

TEXTO DA ANA MURTEIRA

festa de 10º aniversário da Marta
Lisboa 9 Novembro 2015

Querida Zuzu, 

No domingo passado acompanhou-me durante todo o dia uma sensação de inquietação e de que devia ligar aos meus Pais. Atribuí a sensação às saudades que já tinha deles, apesar de não ter feito uma semana desde que cá tinham vindo a casa beber café. 

Só à noite, chegada a casa, liguei à minha Mãe, que me perguntou imediatamente "Recebeste o meu mail?" 
Estranhei a pergunta, porque habitualmente os emails que me envia são paisagens, lições de vida, e não estava a ver porque é que alguma delas teria sido crucial, e abri imediatamente o email. 

Foi então que vi que ela me tinha encaminhado o convite para o livro da Marta. 
"Pois... a Zuzu escreveu um livro sobre a Marta e apresentou-o hoje na Casa do Alentejo". 
Não li o convite. E assim perdi a oportunidade te vos ver, te abraçar, e de te ouvir finalmente partilhar a tua dor, a tua perda e todas as emoções que vocês viveram nestes anos. 

Talvez te pareça perfeitamente extemporâneo este email, depois de tantos anos de ausência, mas compele-me a escrevê-lo tudo o que senti nessa noite e a amizade - sim, mesmo depois de anos - que te tenho. :) Perdoa-me se de alguma forma entro mais do que devia na tua esfera privada ou se digo algum disparate, mas é que gosto tanto de ti! E gostei tanto que tivesses escrito este livro! 

O email tinha um link para os teus blogues, e a noite decorreu num percurso demorado pelos teus pensamentos, pelas memórias, pelas cartas e pela vossa dor que na altura não soube partilhar. Porque era muito jovem, porque não sabia como se aborda uma pessoa que perdeu um filho!! 
Por cada carta tua, uma lágrima minha à espreita. 

Lembro-me tão bem de que quando vinhas a nossa casa a tua voz e o teu riso enchiam a sala, como sempre: aquele sorriso vivo, aquela presença forte, alegre, a presença meiga e serena do Zé ao lado. Não via tanto a Marta nem a Rita, via-as de passagem, a Rita sempre com o seu olhar vivo e curioso, a Marta sempre com aquele sorriso marcante. 

Quando a minha Mãe me anunciou a partida da Marta, revi a imagem dela à porta, mãos nos bolsos, o sorriso doce, sincero e enorme. Aquele silêncio, aquele modo reservado dela não emanavam senão paz e serenidade a quem pouco a conhecia, como eu. Era como se aquele olhar terno escondesse uma sabedoria enorme, como se não fosse bem deste mundo. 

E apesar de não ter sabido como podia apoiar-te, sempre tiveste um lugar especial para mim, não sei se alguma vez vos dei a saber quanto gosto de vocês. 

Lendo depois o livro da Marta, que a minha Mãe me emprestou ontem, percebi que não tinha sido a única a ter medo de vos abordar, nunca saberia se era o momento certo de vos obrigar a lidar com isso abertamente, se o desejavam sequer.

Uma página a seguir à outra vão revelando a vossa unidade como família, revelam o amor que vos une, a batalha tremenda que vos foi imposta, mas também muito mais: revelam, nas fotos, nos escritos do diário, nas suas mais breves descrições das suas atitudes, revoltas e desejos, nos testemunhos da família, a pessoa que dá o nome ao livro. 

Este livro é uma coisa maravilhosa!! É incrivelmente corajoso da tua parte que o tenhas terminado e lançado! 
É uma coisa maravilhosa saber ou sentir que de alguma forma a Marta revive nas tuas palavras, e que escolheste mostrá-la ao Mundo, mostrar o que se escondia por trás daquela doçura inefável. De alguma forma, nas descrições que fazes dos momentos em família, volta a existir aquela família feliz, e eu sei que nada pode fazer esquecer, e não acredito que seja suposto esquecer. 
Mas para quem o lê e "ouve" as palavras que lhe dedicaste diariamente, as palavras dela, as das amigas, e "vê" os seus passeios, as férias, os momentos com a família, há a sensação de que este livro é a sua imortalização, é a persistência da família em que ela esteja sempre presente, para sempre. 

Desejo muito que ela se mantenha viva em vocês, que essa presença se torne a paz e a doçura que caracterizavam a Marta e um dia, quem sabe, se torne só um bocadinho menos penoso.
És uma lutadora, Zuzu. 
E tenho de te agradecer teres continuado a lutar e teres-me apresentado, neste livro, a verdadeira Marta. 
Gostei muito de a conhecer. É o retrato de uma pessoa muito pura e bonita, que realmente vale a pena conhecer, e da luta da sua família em mantê-la perto. 

Obrigada, Zuzu! 

Um abraço forte, um beijo sincero, e a minha amizade e admiração profundas!! 

Ana 
Resposta da Ana
Zuzu querida :)
Não imaginas como fiquei feliz por saber que de alguma forma as minhas palavras te trouxeram uma alegria!
Sabe que, se alguma beleza viste nelas, não é senão o reflexo da beleza da tua partilha, que tanto e tão profundamente me tocou.
Aos que estão de fora, ao lado, pouco há a dizer ou fazer para curar uma dor tão terrível, mas que bom é saber que por momentos podemos trazer algum calor ao coração dos que amamos!
Essa, acredito, é a força e a razão do amor e da amizade, e és tu a responsável por isso, porque como diz a rosa ao principezinho, os amigos cativam-se... E depois guardamo-los no coração para sempre, se choram choramos com eles, se os fazemos sorrir, sorrimos :)
Obrigada por me fazeres sorrir :)
Beijo enorme e um abraço tão forte!
Ana que te adora! 


 RESPOSTA AO TEXTO PELA MINHA CUNHADA ODÍLIA

odilia baleiro

15 de nov
para mim
Obrigada Zuzu,

por partilhares este texto da Ana, tua vizinha, próxima da idade da Marta, suponho  que, vivendo no mesmo prédio, pouco contacto tinha com ela, quase  não a conhecia.
Este texto tem uma dimensão tal, sincero, lindo, bem escrito, reflectido, eloquente,  brilhante, diria mesmo e que cumpre todos os  objectivos que delineaste qdo prometeste à Marta que a darias a conhecer nas suas vertentes de jovem que sabia o que queria, de jovem sensível à qual os problemas do mundo cedo começaram a constituir para ela uma preocupação, criativa,  bondosa e solidária para com os que a rodeavam...
É isto que tu querias! 
E é isto que está a acontecer!!!
Já tiveste outros testemunhos, e outros que não tiveste feed-back, ou pq não têm jeito para escrever, ou pq não estão para isso, ou porque...mas sabes que é assim que as pessoas percepcionam. 

Eu sei, eu sei que para um mãe isto não chega, não pode chegar,  nada chega porque nada pode trazer a Marta de volta, como diz o ditado "só não há remédio para a morte", é tremendamente insuportável e  irreversível!!!!!

Escreveste o livro, conseguiste publicá-lo, estás a partilhá-lo, as pessoas têm acorrido à tua solicitação, vinte anos volvidos conseguiste dar a conhecer a verdadeira Marta que muito poucos conheciam. 
A Marta está agora mais entre nós! 
Missão cumprida!

E então que fazer?! Não sei, não sei... tu dizes que não sofres nestes eventos...eu acho que te esgotas neles, ficas muito cansada (também não é para menos) e o Zé tão diferente de ti, ainda não percebi bem, se ele acha bem esta promoção/ apresentação do livro?!
 Parece-me que ele preferia, ok, livro escrito, publicado e pronto! Não achas?!!

Nota-se que ele tem muita preocupação contigo, com a tua mobilidade, as queixas que tens sempre, que qq dia não te mexes...
E aí ele tem razão Zuzu. 
Tens de pensar seriamente que a tua cabeça para funcionar precisa de um corpo ao qual tu tens de dar atenção. 
Desculpa...mas quero-te muito bem e gostaria de ver-te mais saudável, mas só tu podes melhorar um pouco a situação.

Acho que teres conseguido publicar o livro da Marta foi uma coisa  boa que te aconteceu, tirou-se esse peso de cima, cumpriste a promessa, embora nada te traga a Marta de volta... acho que te sentes muito bem a dares aulas na Academia de Estremoz e acho que sim deves continuar, mas tens de encontrar tempo para ti, para a tua pessoa!!!

Pensa bem, como encontraste esse grupo de pessoas com quem fazes essas actividades que tanto prazer te dão, tenta encontrar, entre as tuas amigas, algumas que façam algumas caminhadas regulares - dá tanto resultado - e ainda por cima não se paga nada - e tu moras num sítio onde podes fazer livremente esse exercício! 
Tens é de encontrar prazer nisso, encontrar as pessoas certas, as horas certas... há tempo para tudo e tu sabes bem que há!

Eu só te estou a falar tb neste assunto, pq sei que é uma questão que tb te preocupa muito, também! Tens tido tanta coragem, tens  tomado tanta decisão, tens de  pensar como inverter alguns hábitos... só tu podes.

Abraço sempre da mana

Odília
Resposta ao texto pela Rita
Alô, mãe :)

Que carta maravilhosa, linda, madura, inteligente e com tanto amor!

Eu ainda penso na Ana como sendo uma menina, pequenina, tão bonita, mas a Ana cresceu e está ainda mais linda, a contar pelas palavras que te enviou.

Maravilhosa, mesmo. Que bom. Deves ter ficado muito feliz, não é?

Um beijo grande, grande.
Rita